O projeto ferroviário português de alta velocidade cancelado em 2012, um investimento superior a 11,6 mil milhões de euros, não teria “viabilidade financeira”, de acordo com a auditoria do Tribunal de Contas (TdC).
“Os estudos preliminares demonstraram que o investimento na rede ferroviária de alta velocidade não apresentava viabilidade financeira. Os mesmos estudos demonstraram que o eixo Lisboa-Madrid, o primeiro que se previa vir a ser implementado, também seria financeiramente inviável”, lê-se na auditoria divulgada hoje sobre o projeto que se iniciou em 1988 e foi cancelado em 2012.
O investimento seria implementado com base num modelo “sem paralelo em termos internacionais”, assente em seis contratos de Parceria Público-Privada (PPP) cujos encargos para os parceiros públicos ascenderiam a 11,6 mil milhões de euros.
“Os riscos de procura relevantes recairiam sobre a CP e a REFER, empresas públicas economicamente deficitárias. Em contrapartida, os pagamentos pela disponibilidade da infraestrutura às concessionárias gozariam de estabilidade, caraterística típica das rendas”, alerta o relatório do TdC.
A auditoria conclui que “não há evidências de que os benefícios ultrapassariam os custos com a rede ferroviária de alta velocidade”.
O projeto foi iniciado “sem ser possível aferir o custo-benefício para Portugal e o Estado não comprovou, perante o Tribunal, a comportabilidade dos encargos que decorriam do único contrato PPP assinado e ao qual foi recusado o visto prévio” para o troço Poceirão-Caia.
Além da falta de viabilidade financeira, o Tribunal de Contas detetou “algum excesso de otimismo” na tentativa de implementar um modelo não testado “sem a utilização do que habitualmente se designa por projeto-piloto”.
“Atendendo à complexidade e à falta de experiência prévia na implementação de um sistema de transporte inteiramente novo, (…) permite concluir por algum excesso de otimismo, porquanto seriam de admitir imprevistos durante todo o processo”, lê-se no documento hoje divulgado.
O projeto de alta velocidade previa desenvolvimento de uma nova rede ferroviária para o transporte de passageiros e de mercadorias, capaz de suportar tráfego a velocidades máximas entre 250 e 350 Km por hora.
O desenvolvimento dos estudos necessários e o lançamento dos procedimentos de contratação estiveram a cargo da RAVE, empresa constituída em 2000 para o efeito.
A instituição liderada por Guilherme d’Oliveira Martins refere que “as conclusões e observações do relatório têm o propósito principal de identificar aspetos relevantes para a gestão de futuros investimentos públicos”.
Cancelado em 2012, o projeto teve como impactos financeiros 120 milhões de euros despendidos em contratação externa, ao longo de cerca de doze anos de estudos, e 32,9 milhões de euros despendidos em custos de estrutura da RAVE.
As áreas de estudo prévio, ambiental e projeto representaram a maioria do valor adjudicado, cerca de 40% do total, no valor de 48 milhões de euros.
O eixo que gerou um maior custo com contratações externas foi o eixo Lisboa-Porto (19,7 milhões de euros). O eixo Lisboa-Madrid representou um valor de adjudicações de cerca de 11,2 milhões de euros.